domingo, 31 de janeiro de 2010

Vida e Morte no Trabalho: Acidentes do Trabalho e a Produção social do erro

Por: Carlos Machado de Freitas
Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil.

 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 24(9):2193-2196, set, 2008




VIDA E MORTE NO TRABALHO: ACIDENTES DO TRABALHO E A PRODUÇÃO SOCIAL DO ERRO.


Dwyer T. São Paulo: Editora da Unicamp/Multiação


Editorial; 407 pp.


ISBN: 85-26807-17


Para Giddens (*1), em seu livro As Conseqüências da Modernidade (1990), o industrialismo constitui um dos feixes organizacionais de modernidade. Sua principal

característica é constituir uma organização social regularizada que tem como objetivo coordenar atividades humanas, máquinas e aplicações de matérias-primas para a produção de bens. Assim, embora tenha emergido na Europa do século XVII, enquanto feixe organizacional da modernidade suas influências se estenderam no tempo (aplicando-se mesmo aos cenários atuais de alta tecnologia) e no espaço, atingindo não só as diferentes partes do planeta, como se expandindo para além dos locais do trabalho e afetando transportes, comunicações e a vida doméstica, só para citar alguns

exemplos. Historicamente, esse feixe organizacional que ganhou materialidade nas indústrias, com a máquina a vapor, e na busca de fontes de energia, nas minas de

carvão, teve como um de seus custos humanos acidentes e mortes de trabalhadores. Assim, se para a maioria da população os acidentes decorrentes da industrialização eram e ainda são uma preocupação distante, para uma minoria estes foram e ainda são uma realidade cotidiana.

Tom Dwyer em seu livro Vida e Morte no Trabalho

– Acidentes do Trabalho e a Produção Social do Erro

(2006) não nos permite esquecer isso.

Quinze anos após a primeira publicação em inglês do livro Life and Death at Work – Industrial Accidents as a Case of Socially Produced Error, finalmente o leitor brasileiro foi presenteado com a publicação da tradução desta obra de referência para todos aqueles que estudam a origem e as causas dos acidentes industriais que têm como principais vítimas os trabalhadores. Em um esforço de construção de uma sociologia dos acidentes de trabalho, este é um importante livro para todos os que se dedicam às questões relacionadas à saúde e à segurança dos trabalhadores (profissionais como ergonomistas, engenheiros, psicólogos, médicos, sindicalistas e pesquisadores, por exemplo).

Inicialmente, o autor nos remete ao processo histórico em que o emprego de novas tecnologias no processo de produção industrial e de seus acidentes já surgia como um problema público, provocando intervenções técnicas, bem como uma incipiente e limitada legislação com o objetivo de controlar e prevenir

acidentes industriais. Demonstra como, por meio das intervenções técnicas e das políticas de compensações para os acidentes, principalmente no período entre o

fim da I Guerra Mundial e os anos 60 do século XX, consolida-se um processo iniciado no século XIX, ou seja, a retirada da esfera pública da visibilidade dos acidentes e da miséria de suas vítimas. A partir daí, Tom Dwyer constrói sua teoria dos acidentes

industriais enquanto erros produzidos socialmente, conceituando que as relações entre os trabalhadores em seus ambientes de trabalho são gerenciadas por meio de relações sociais de trabalho, que, nas indústrias, podem ser identificadas em quatro níveis.

O primeiro é o nível de recompensa, que envolve

dos incentivos financeiros aos simbólicos que premiam

a ampliação do trabalho que ocorre muitas vezes

em detrimento das condições de segurança.

O segundo nível é o de comando, que envolve o autoritarismo e as restrições da autonomia dos trabalhadores, com implicações sobre os grupos de trabalhos,

ocasionando a desintegração dos mesmos e, por conseguinte, dos conhecimentos e capacidades de resistência coletiva. Neste nível encontra-se também o que o autor denomina de servidão voluntária, em que trabalhadores consideram normal o trabalho em ambientes insalubres, preferindo estar em harmonia com os objetivos do empregador ao invés de confrontá-lo.





O terceiro é o organizacional, envolvendo a baixa qualificação dos trabalhadores, a rotina com empobrecimento do conteúdo do trabalho e a desorganização da indústria expressa na dissociação entre manutenção e operação, na busca de atalhos perigosos no processo produtivo para manter os níveis de produção, nos erros imprevistos dos sistemas complexos com processos altamente interligados.





O quarto nível é o do indivíduo e sua autonomia. Neste o trabalhador não é totalmente organizado, comandado e nem recompensado, de modo que os empregadores não governam e controlam suas conseqüências. Assim, ainda que integrando uma organização e afetado e influenciado pelas relações sociais dentro da mesma, o trabalhador detém certo grau de autonomia, sobre a qual as empresas procuram desenvolver técnicas de administração (seleção, disciplina, rotina

de trabalho etc.) de modo a restringi-la.







Tem como base um amplo levantamento bibliográfico dos estudos sobre acidentes e a teoria social, uma robusta formulação teórica e conceitual e um amplo trabalho empírico sobre o trabalho em turno e acidentes de três fábricas, em que procura testar sua teoria dos acidentes industriais em cada um dos níveis propostos.

Esses elementos permitem que no último capítulo, denominado “reajustando o prisma”, Tom Dwyer utilize os exemplos dos acidentes industriais ampliados ocorridos nos anos 70 e 80 como desencadeadores de um processo de crise e renovação das intervenções de profissionais e de governos nos países industrializados. Tom Dwyer nos oferece não só o prazer de ler um trabalho científico muito bem construído, mas também uma série de insights para se refletir e investigar sobre muitas questões relacionadas aos acidentes de trabalho e industriais. Chamamos a atenção para duas.

A primeira é a invisibilidade dos acidentes de trabalho, cuja face mais conhecida para a Saúde Pública no Brasil é o ainda elevado nível de subnotificações destes

eventos.

A segunda, que se relaciona à primeira, é sobre os mecanismos sociais que contribuem para que ainda perdure no país a culpabilização das vítimas pelas

causas dos acidentes que afetam ou interrompem suas vidas.

Tornar os acidentes invisíveis e culpar as vítimas dos mesmos quando se tornam visíveis são processos que se encontram relacionados no papel que o Brasil ocupa dentro do industrialismo como uma das dimensões da globalização. Como observa Giddens , a expansão da divisão global do trabalho é um dos aspectos do industrialismo enquanto feixe organizacional da modernidade, e que inclui diferenciações tanto

entre áreas mais e menos industrializadas do mundo no mundo, como no que se refere à especialização regional

em termos de tipo de indústria, capacitações e a produção de matérias-primas. É esta divisão do trabalho, que resulta em uma subseqüente divisão global

dos riscos e dos custos humanos, que permite que o Brasil ainda não tenha vivido uma crise de renovação das intervenções de profissionais e de governos, pois se a tivesse, não teríamos mais a possibilidade de subnotificações e também da culpabilização das vítimas. Em relação a essa segunda questão, basta lembrarmos como em todas as vezes que ocorre um acidente industrial, nos transportes (aviões e trens, por exemplo) ou na busca de fontes de energias (plataformas de petróleo, por exemplo), antes mesmo de investigar suas causas, profissionais e governos se apressam em culpar os trabalhadores, procurando assim reafirmar que o industrialismo, enquanto organização social, vai bem e continuará operando de modo seguro. Perigosos são os trabalhadores.



Se este é o quadro atual, não podemos deixar de ter a esperança que Tom Dwyer deposita no seu último

capítulo:

“...a esperança de que os atores sociais e as relações

sociais concretas passarão a ser considerados de

maneira mais ampla como responsáveis pela produção

de acidentes...” (p. 28).



Essa esperança não só transformaria os acidentes em eventos capazes de resultar em um aprendizado social, mas também em medidas de controle e prevenção mais contextualizadas e efetivas.


*1. Giddens A. As conseqüências da modernidade.


São Paulo: Editora Unesp; 1990.

POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL. Hochman G,

Arretche M, Marques E, organizadores. Rio de

Janeiro: Editora Fiocruz, 2007. 398 pp.

ISBN: 978-85-7541-124-7

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Conferência Internacional sobre Redes Sociais

Promovida por pessoas conectadas à Escola-de-Redes, uma rede de mais de 3 mil pessoas coligadas para estudar, investigar e experimentar redes sociais e desenvolver novas tecnologias de netweaving (articulação e animação de redes), ocorrerá em Curitiba, entre os dias 11 e 13 de março de 2010, a Conferência Internacional sobre Redes Sociais (a sigla é CIRS).

Três grandes palestras, em auditório com capacidade para mais de 1 mil pessoas, constituirão o ponto alto do encontro:

A primeira, O Poder de Organizar sem Organização será ministrada por Clay Shirky, palestrante internacional com grande projeção no momento. Shirky (Nova York) é escritor (seu último livro, ainda inédito no Brasil, tem como subtítulo o tema da palestra), professor de Efeitos Econômicos e Sociais das Tecnologias da Internet e de New Media na New York University.

A segunda, Redes sociais e emergência, será proferida por Steven Johnson (também de Nova York), outro palestrante de renome internacional, autor de 6 best-sellers sobre intersecção entre ciências, tecnologia e experiências pessoais. Seus livros têm influenciado desde a forma de campanhas políticas utilizarem a internet até as idéias mais inovadoras de planejamento urbano, passando pela batalha contra o terrorismo do século 21.

A terceira palestra, O futuro da investigação sobre redes sociais, será ministrada por Pierre Lévy (Ontário), filósofo, escritor e professor do Departamento de Comunicação na Universidade de Ottawa, Canadá e da Universidade Paris VIII. Lévy estuda o conceito de inteligência coletiva e sociedades baseadas no conhecimento. É um pensador mundialmente reconhecido no campo da cibercultura.

Haverá ainda uma discussão, desafiadora e polêmica, sobre a nova educação na sociedade em rede, intitulada Sistemas Sócio-Educativos: Comunidades de Aprendizagem em Rede (Arranjos Educativos Locais). Nessa atividade deverão ser questionados pela raiz não apenas os métodos de ensino ainda utilizados, mas o próprio conceito de educação como ensino, a instituição chamada escola e o papel (anacrônico) do professor. A grande estrela aqui será José Pacheco (Portugal), educador, escritor, mestre em Ciência da Educação. Ele foi o idealizador e coordenador da famosa Escola da Ponte, projeto educativo baseado na autonomia dos estudantes.

O evento também abrigará dois minicursos. O primeiro, Netweaving (Articulação e Animação de Redes), será ministrado por Augusto de Franco (São Paulo), netweaver da Escola-de-Redes e autor de mais de vinte livros sobre desenvolvimento local, capital social, redes sociais e democracia. O segundo minicurso, Introdução à Análise de Redes Sociais, será ministrado por Clara Pelaez Alvarez, analista de sistemas pela PUC de São Paulo, CEO da Neuroredes, empresa brasileira de consultoria em gerenciamento e especialista em Neurometria: mapeamento, desenho e análise de redes de conhecimento.

Para os promotores da Conferência o mais importante, porém, é o Simpósio da Escola de Redes, que ocorrerá nos dois primeiros dias do encontro: uma espécie de Open Space (ou “Desconferência”) onde os membros conectados à Escola-de-Redes vão, eles mesmos, definir a pauta e as atividades que serão desenvolvidas. Mais uma vez aqui a CIRS inova, seguindo a orientação – que tudo indica será predominante nos tempos que chegam – de organizar sem organização.

Uma característica inovadora da CIRS é o seu processo de realização: o evento está sendo divulgado e organizado de modo distribuído. Ou seja, cada pessoa que quiser colaborar pode divulgar o evento como se fosse seu: pode inventar uma marca, fazer e distribuir um folheto ou um cartaz, criar um banner para publicar no seu site, blog ou plataforma de rede na Internet – tudo isso sem a necessidade de pedir autorização, receber orientação e sem precisar entrar em contato com alguém. Patrocinadores ou apoiadores podem colocar a sua marca comercial nas peças publicitárias que veicularem, também sem qualquer necessidade de entendimento prévio. Em suma, como diz o tema da palestra de Clay Shirky, uma das mega-estrelas do evento, a CIRS está testando o poder de organizar sem organização.

Para quem já investiga, estuda ou trabalha com o assunto ou para quem quiser ficar atualizado com o tema, a Conferência Internacional sobre Redes Sociais é uma oportunidade imperdível.

Serviço

Inscrições e mais informações na plataforma interativa da Escola-de-Redes:
A CIRS – Conferência Internacional sobre Redes Sociais será realizada de 11-13 de março de 2010, no CIETEP (no Centro de Convenções da FIEP - Federação das Indústrias do Estado do Paraná): Avenida Comendador Franco 1341, Jardim Botânico, Curitiba, Paraná, Brasil.

A CIRS, embora organizada autonomamente, compõe a constelação de atividades aninhadas na Conferência Internacional de Cidades Inovadoras (CI-CI 2010): CIETEP, Curitiba 10-13 de março de 2010. Para mais informações sobre a CI-CI 2010 clique no link: http://www.cici2010.org.br/

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

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